O brasileiro é conhecido como um povo criativo por natureza. Mas a criatividade atribuída a nossa gente tem mais ligação com a gambiarra do que com a criatividade propriamente dita. Há especialistas que são mais taxativos: dizem que o brasileiro não é nada criativo.

A grande diferença da invenção para a gambiarra é que a primeira é uma solução para um problema. Só que uma solução definitiva ou pelo menos duradoura, até que alguém invente algo ainda melhor. Já a gambiarra é uma adaptação para também resolver um problema.

Como a maioria dos países pobres ou em desenvolvimento, o Brasil tende a gerar mais gambiarras do que invenções. O que o brasileiro faz muito bem é enfrentar a falta de dinheiro com soluções personalizadas. Isto é: diante da falta de recursos, ele resolve com o que tem.

Há quem ache criativo que um indivíduo coloque uma cadeira dentro de um sofá para resolver o afundamento do estofado até poder consertar. Na verdade, isto é uma forma bem-humorada de enfrentar a falta de dinheiro, jamais será uma solução a ser replicada em série.

Pelo Brasil a fora há uma infinidade de aplicações como essa: o guarda-chuva usado para secar roupas durante a precipitação, o bombril na antena de TV para sintonizar, o parafuso prendendo a tira do chinelo arrebentado e a churrasqueira de tijolo com grade de forno de fogão.

A lista é interminável, até porque as dificuldades vão ao extremo em um país com dimensões continentais como o Brasil. Além disso, estamos acostumados a esperar por solução definitiva apenas do líder. Temos uma sociedade autocrática, na qual tudo deve partir do presidente.

Enquanto o presidente ou líder político ou chefe não faz algo que resolva a situação, as pessoas se ajeitam como podem. É aí que nascem as gambiarras, o jeitinho brasileiro tão famoso. Quem perde com isso é a sociedade como um todo, pois não se desenvolve como precisa.

Uma rápida visita ao órgão que concede patentes no Brasil mostra que o número delas, registradas pelos brasileiros todos os anos, é infinitamente menor, comparativamente falando, que o de países como a Suíça, os Estados Unidos e muitos outros do eixo asiático.

É bem verdade que o número de pedidos de patentes e de registro de propriedade intelectual, no Brasil, tem crescido nos últimos anos. A Organização Mundial da Propriedade Intelectual (WIPO, em inglês) assinala aumento de 55% no primeiro e de 10% no segundo em 2018.

Mesmo assim, se comparado com a China, que responde hoje por 44% dos pedidos de patentes globais (1.381.594 pedidos realizados, duas vezes mais que os Estados Unidos, segundo o último levantamento da WIPO), esse crescimento ainda é pouco expressivo pelo tamanho do país.

É importante refletir que a criatividade é a habilidade que mais se valorizou no mercado de trabalho nos últimos anos. No Fórum Econômico Mundial deste ano, ela figura como terceira habilidade mais importante entre dez principais para se ter sucesso em 2020.

O detalhe fundamental é que em 2015 a criatividade ocupava a décima colocação no ranking. Comparando as listas, não se observa grandes mudanças entre 2015 e 2020, com exceção da criatividade. Mais que isto: esta é uma habilidade e não um dom, portanto pode ser desenvolvida.

Se observarmos o último boletim do Instituto Nacional de Propriedade Industrial, o órgão que registra as patentes, veremos que 44% dos pedidos de patente de invenção, feitos de janeiro a julho deste ano, partiram de inventores independentes, ou seja, de pessoas físicas.

Outro dado interessante desse boletim é que exatos 66% dos pedidos de patentes de modelos de utilidade também partiram desse tipo de inventor, o que nos remete a uma falta de estrutura para ampliar o número de patentes registradas e melhorar o grau de soluções no país.

Neste sentido, é fundamental que as empresas percebam que a inovação e a criatividade dependem fundamentalmente de um ambiente que as estimule e de processos que as viabilizem em sua plenitude, para poderem chegar à materialização em um resultado, produto ou ação.

Todo esse contexto ainda é raro no Brasil. De modo geral, há muitas empresas hierarquizadas, onde as pessoas procedem segundo normais mais ou menos inflexíveis e a inovação e a criatividade passam a ser pontos de conflito entre os empregados e as chefias. Aí estagnam.

Dependendo do segmento onde a empresa atua, 90% das melhores ideias vêm dos clientes, o que comprova que a estrutura não é adequada para valorizar a inovação e a criatividade entre os empregados, embora se destaque aqui a importância de programas que dão voz aos clientes.

A criatividade está em todos nós, mas precisa ser estimulada para se desenvolver. O que essa infinidade de inventores independentes precisa é de empresas abertas a esse estímulo. Empresas que tragam no seu DNA o interesse em fazer acontecer. Uma boa ideia depende disso.

Para chegar lá, as empresas precisam de um RH capaz de criar um ambiente ideal para favorecer a criatividade. Isto passa pela revisão de modelos de gestão de pessoas e de algo que é fundamental: a vontade de ser inovador e de saber absorver ideias inovadoras e criativas.

A semente precisa ser lançada sempre.

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